Hoje, com as mudanças sociais, é um perigo abrir a boca. O recomendável é carregar uma régua para medir as palavras.
Rui de Albuquerque
Sempre que encontrava com Bigú eu usava a expressão “ diga negão filho de uma puta”. É claro que ele sentia que não havia nenhuma, mas nenhuma intenção de ofendê-lo. Às vezes até sacaneava com ele mudando a frase. “ Diga, cidadão de fortes traços africanos cuja a mãe tinha um certo desvio de conduta social”.
Ele sempre ria e retribuía a minha fala. “ Diga, professor de Inglês “. É claro que ele tava me chamando de viado. A fama que corria na época era que quem ensinava a língua de Shakespeare queimava a rodinha. Era QUASE uma verdade. Boa parte dos meus colegas de profissão tinha ojeriza ao sexo oposto.
Hoje, como tudo que a gente fala ou escreve é considerado assedio, tenho a preocupação de policiar o meu linguajar cotidiano, deixando Jorge Amado de lado e rebuscando Shakespeare. Portanto, ao me esbarrar com o velho Bigú, me limito a usar a frase padrão e politicamente correta. “Bom dia, Senhor Bigú. Como tem passado ?”

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