A planta Cannabis, conhecida popularmente como maconha, é mundialmente utilizada no tratamento de diversas doenças. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autoriza a comercialização de quinze produtos derivados da erva, sendo cinco à base de extratos de Cannabis sativa e dez do fitofármaco canabidiol (CBD). O problema, relatado por pacientes, está no alto custo do medicamento. A solução tem sido buscar o Poder Judiciário para plantar e extrair o óleo terapêutico em casa.
Emanuelle Oliveira
De acordo com o professor universitário e advogado Fabricio Posocco, do escritório Posocco & Advogados Associados, as ações já chegaram ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ganharam sinal verde. Por unanimidade, em junho deste ano, os ministros da Sexta Turma do STJ autorizaram três pessoas a cultivarem a maconha para fins medicinais, sem o risco de sofrerem repressão por parte da polícia.
“A norma penal incriminadora mira o uso recreativo, a destinação para terceiros e o lucro, visto que, nesse caso, coloca-se em risco a saúde pública. A relação de tipicidade não vai encontrar guarida na conduta de cultivar planta psicotrópica para extração de canabidiol para uso próprio, visto que a finalidade aqui é a realização do direito à saúde, conforme prescrito pela medicina”, argumentou o ministro Sebastião Reis Júnior em seu voto favorável.
Autorização para produção artesanal
Para o advogado Fabricio Posocco, o precedente aberto pelo STJ permite que outros tribunais passem a autorizar pedidos semelhantes. O especialista orienta que para importar as sementes é preciso cumprir alguns requisitos.
“O paciente ou representante legal deve buscar um advogado de confiança ou a defensoria pública, uma vez que o plantio da Cannabis e a produção artesanal do óleo devem ser concedidos pela Justiça. O juiz vai analisar a necessidade médica comprovada e imprescindível do produto, a partir do receituário e do laudo assinado pelo médico que assiste o enfermo”, orienta o advogado.
Posocco conta que pode ser incluído na ação a autorização da Anvisa que permite às pessoas físicas importarem itens derivados da maconha. “Mesmo já tendo produção nacional, grande parte do medicamento vem de fora. Por isso, muitos pacientes têm esse documento”.
O formulário para importação e uso de produtos à base de Cannabis é encontrado nos postos da Anvisa – aeroportos e áreas de fronteiras – e também no site gov.br.
Tratamento pelo SUS e plano de saúde
Em 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou o entendimento de que é dever do Estado fornecer medicamento essencial para tratamento que, embora sem registro na Anvisa, tenha sua importação autorizada pela agência.
A determinação da Corte foi emitida atendendo pedido de uma criança com encefalopatia crônica e epilepsia. O paciente provou a imprescindibilidade do tratamento à base de canabidiol e a impossibilidade de ele ser substituído por outro medicamento previsto no Sistema Único de Saúde (SUS). Além disso, os representantes legais da criança demonstraram ter incapacidade econômica para o custeio. O único óleo extraído da Cannabis produzido comercialmente no Brasil chama-se Prati-Donaduzzi. Ele é vendido em frascos com 30ml, por valores que variam entre R$ 275 a R$ 2.800, dependendo da concentração do ativo.
O advogado Fabricio Posocco lembra que, conforme o caso, a regra do STF pode ser aplicada ao beneficiário de plano de saúde que tem o tratamento negado. “Não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do rol da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), o médico deve expedir um laudo explicando por que o remédio à base de CBD é o indicado para a situação, apontando a ineficácia de outros fármacos utilizados ao longo do tratamento da doença. Com esse documento, o paciente ou o representante legal pode buscar o Poder Judiciário”.
Benefícios do canabidiol
De acordo com dados da Anvisa, levantados pela Agência Brasil, estima-se que mais de 100 mil pacientes façam algum tipo de tratamento usando Cannabis no país. O uso terapêutico do canabidiol, sob prescrição médica, está comprovado cientificamente em cerca de 50 países.
O óleo extraído da Cannabis pode aliviar problemas de saúde mental, convulsões, dores e insônia. Desta forma, tem sido indicado para pacientes com transtorno do espectro autista, transtorno de ansiedade, câncer, Parkinson, Alzheimer, epilepsia, estresse pós-traumático, Síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut, Complexo de Esclerose Tuberosa, Síndrome de Dravet, Doença de Chron, entre outras.
“O tratamento do paciente com a substância, de acordo com a lei vigente, depende exclusivamente de recomendação médica e de produtos regulamentados pela Anvisa”, finaliza o especialista do Posocco & Advogados Associados.