Você se recorda a última vez que foi tomado pelo sentimento de ódio? Apesar de ser um sentimento temido pelas pessoas, ele pode ter seu lado positivo e ser capaz, até, de estimular atitudes favoráveis.
“A questão será o que fazer com ele e como realizar a mudança. Sentir raiva de alguém ou de uma situação pode ser o primeiro passo positivo, como sair de um relacionamento tóxico”, exemplifica Paula Dione Casais, médica psiquiatra do HUPES-UFBA (Hospital Universitário Professor Edgard Santos da Universidade Federal da Bahia), vinculado à Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares).
Para ela, os tipos de ódio podem trazer consequências diferentes. Por exemplo, o que decorre da inveja pode dar lugar a um drama social, por fazer ver que o outro constitui obstáculo à satisfação de seu desejo pessoal. Esse ódio invejoso tem parentesco com a agressividade e constitui fonte de destruição pessoal e coletiva.
“Já o do tipo narcisista dificulta o convívio em sociedade, por ser avesso à alteridade. Alguns autores sugerem, no entanto, que durante o desenvolvimento psíquico se faz necessário algum processo de ódio, discutido nesses contextos como algo que ajuda a separar-se do eu”, diz a psiquiatra.
Priscilla Godoy, psicóloga da Unidade Campo Belo do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, enfatiza que o prejudicial, no geral, é como as pessoas se comportam diante do sentimento de ódio e não ele em si.
No campo individual, ele costuma desencadear reações orgânicas similares às do estresse. “Do ponto de vista coletivo, o ódio é capaz de levar a manifestações de hostilidade, agressividade e prejuízo da urbanidade, dificultando o convívio com a diversidade e a tolerância com o outro”, diz Casais.
É fácil comprovar como a emoção é capaz de mobilizar multidões e provocar os mais variados conflitos. Demonstrações desse tipo têm ocorrido com muita frequência na internet. Os chamados “haters” (ou “odiadores”) se apropriam da sensação de anonimato e dão voz aos discursos de ódio.
“As redes sociais desumanizam o interlocutor, logo fica mais corriqueiro desferir uma ofensa a alguém que não está presente fisicamente. Quando pessoas se mobilizam pelo ódio ao mesmo objeto, seja a uma ideia, um partido político ou até mesmo outra pessoa, elas se fortalecem, pois sentem que não estão sozinhas. E todo esse processo se mantém protegido pelo anonimato. Assim, pode-se dizer que as pessoas se unem pelo amor ou pelo ódio em comum”, diz André Luis Masiero, psicólogo do Departamento de Atenção à Saúde da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos).
O que é o ódio
No dicionário, ele é definido como antipatia ou aversão. Trata-se de um sentimento negativo em que se deseja mal ao sujeito ou ao objeto odiado, relacionado com a inimizade e a repulsa, como esclarece Casais.
A emoção é visceral e está atrelada a frustrações: é gerada pela impossibilidade de satisfação de interesses ou ideologias pessoais e, também, pelo medo que surge provocado pelo instinto de autopreservação.
Ao sentir a ameaça, o indivíduo é tomado pela aversão, seguido do desejo de ataque e eliminação da pessoa ou objeto odiado. Porém, Masiero ressalta que nem sempre a ameaça é real. “O ódio pode ser despertado por uma fantasia”.
Nas palavras da psicóloga Priscilla Godoy, natural, o ódio é produzido por nosso cérebro com intuito de proteção. “O gatilho que desperta diferentes emoções varia de pessoa para pessoa. Isso tem a ver com a história e as experiências vividas, o meio cultural e social, assim como valores morais, necessidades, crenças sobre si, sobre a vida e personalidade”, acrescenta.
O estado emocional também varia de acordo com a intensidade, que pode ser de um aborrecimento à fúria, acompanhado por uma estimulação do sistema nervoso autônomo, e com o passar do tempo. “Enquanto o ódio se refere a um sentimento, a agressão seria um comportamento destrutivo e punitivo, acompanhado ou não da repulsa”, pontua Godoy.